terça-feira, 12 de junho de 2012

Marketing de Percepção




José  não  é  um  cidadão  comum,  embora  possa assim  parecer  à  primeira  vista.      Jornaleiro,  natural  do Rio  de  Janeiro, atua há dez anos no bairro do Humaitá com a "Banca do Alexandre".
Entre a Lagoa  e  o  Largo  dos  Leões,  em  um  trecho  de  aproximadamente  1  km  e  meio atuam  15  jornaleiros.   Alexandre,  como  é  conhecido no bairro, não  tem a maior banca, não fica aberto 24 horas e fecha cedo aos domingos, mas é o terceiro em vendas e o mais conhecido na região. Possui clientes desde a Praia de Botafogo à Lagoa Rodrigo de Freitas.  Dispõe de serviço de entrega em domicílio ("entrego um
chiclete", diz ele), encomendas, fax, revelação de filmes, pagamento de contas em banco  para  clientes,  aceita  "cheque  pré",  troca  cheques  e  até  toma  conta  de crianças.   O primeiro  jornaleiro a vender camisinhas na cidade do Rio de Janeiro, tem  como  seu maior  público  as mulheres e  as  crianças.   Disponibiliza  figurinhas repetidas  em  consignação.    Toda  semana,  ao  receber  sua  remessa  de  revistas Recreio,  com  as  "Letronix" que  viraram mania ente a  garotada, Alexandre passa seus minutos  vagos  como  "detetive",  decifrando  com  papel  e  lápis  quais  letras estão  em  quais  revistas.  
Ao  encontrar  resultados,  cola  etiquetas  nas  capas,  de modo que as crianças não ganhem  letras  repetidas e as mamães e papais  façam valer  seu  dinheiro  e  seu  tempo.    Cadastro  de  centenas  clientes,  conhece  todos pelo  nome,  promove  vendas  casadas  e  anuncia  no  jornal  de  bairro.  Perguntado qual o segredo de seu sucesso, ele responde: "perseverança".
   Albani Matos,  Cearense  há  nove  anos  radicado  no  Rio  de  Janeiro,    é  um homem conhecido por centenas de mães, pais, crianças e babás que frequentam o por  ele  criado  "Baixo  Bebê  da  Lagoa".    Sua  água  de  coco  é  sempre  doce  e geladinha.  Um alento para atletas, cuidadores e sapecas.  Albani demorou alguns anos  para  conseguir  realizar  seu  sonho,  mas  seus  abaixo-assinados  finalmente
conseguiram o apoio da prefeitura.  Seu ponto tornou-se "point".  Albani não tem os preços mais baixos do mercado, mas com certeza o melhor produto, escolhido por  ele  artesanalmente.    Coco  por  coco.    Oferece  brinquedos  para  as  crianças, música  ambiente  ligada  ao  seu  carro,  conta  corrente,  cadastro  com  fotos  das crianças  e  data  de  aniversário.    Realiza  festas  infantis  com  um  dos mais  lindos
cenários do Rio de pano de fundo.  Suas festas funcionam na base da "vaquinha" e do  "cada  um  traz  um  pratinho",  e  chegam  a  reunir  quatrocentas  pessoas.  Conhece todas as crianças pelos nomes.  ("As babás mudam", diz ele).  Ao entrevistá-lo, perguntei se ele tem planos de  um  dia  voltar  para  o  Ceará.    Uma  das  mães  presentes  apressou-se  em responder: "Só se ele  levar todos nós  juntos".   Seu segredo de sucesso, segundo ele, é "gerar confiança".
 "O  valor  de  uma  empresa  está  cada  vez  mais  condicionado  a  bens intangíveis,  como  o  relacionamento  com  as  pessoas.  Os  bens  tangíveis  de diferentes  empresas  -  fábricas,  escritórios  e  produtos  -  são  cada  vez  mais parecidos entre  si", diz o  sueco Karl Erik Sveiby, um dos pioneiros da gestão do conhecimento.  Dispomos atualmente de incontáveis nomenclaturas e ferramentas de  marketing.    Tentamos  aprender  com  os  segredos  da  "Disney"  para  não repetirmos "Terra Encantada".   Somos seres humanos fazendo negócios de troca com  outros  seres  humanos.    Perceber,  do  latim  "percípere",  segundo  o  nosso Aurélio,  é  "apoderar-se  de,  adquirir  conhecimento  por  meio  dos  sentidos".    A
tecnologia existente não nos pode afastar do objetivo  final deste  jogo de  trocas: apoderar-se da mente e do bolso do seu cliente.  Como fazer isto?  Com percepção para realizar o que emociona o cliente.  "Data", o andróide de "Star Trek", ao ser confrontado  com  a  emoção,  não  sabe  o  que  fazer  com  ela.      A  evolução  vem através  do  andróide  David,  muitos  anos  depois,  em  "Inteligência  Artificial",  o
primeiro autômato capaz de sentimentos reais.
A  tecnologia  agrega  e  facilita,  mas  não  substitui  a  necessidade fundamental do ser humano de se sentir amado e prestigiado.  Facilitar a vida dos clientes com ATM'S e compras virtuais economiza tempo, o que
é  absolutamente  fundamental  no  mundo  de  hoje,  mas  não  gera fidelidade.    A  fidelidade  dos  clientes  está  diretamente  ligada  à segurança,  confiança  e  ao  transtorno  que  seria  causado  pela inconveniência de mudar.  Segurança e confiança são adquiridas através do relacionamento emocional, pessoas  lidando com pessoas, otimizando tempo e esforços em trocas de necessidades e valores.   O Marketing da
Percepção  fundamenta-se  nos mesmos  4  P´s  tão  conhecidos  (produto, preço,  ponto  e  promoção),  e  vai  além:  envolve-os  com  a  auréola  da percepção.  Adquire conhecimento de seus clientes, suas necessidades e valores  e  os  trata  como  gente.    Não  basta  posicionar  o  produto, transmitir a imagem no preço e ponto certos.  Há que cuidar de todos os contatos  de  marca,  administrados  através  dos  intangíveis, imperceptíveis  como  atos  isolados, mas  extremamente  nítidos  e  claros em  seu  diferencial  quando  avaliados  através  dos  cinco  sentidos  do cliente.     O mundo  competitivo  nos  tornou  cada  vez mais  exigentes  e seletivos.  Ficarão no mercado somente as empresas que percebam esta diferença.  Alexandre e Albani perceberam.  Nós, os clientes, também.


Por Maria Cecília Trannin 

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